* Este livro é a continuação do livro Prostituta do Morro do Alemão* Ser dono de um morro, não é uma tarefa fácil. Principalmente quando se tem que lidar com a polícia e com drogas. Esta é a realidade completamente diferente que Maria (Antônia) estava esperando ao sair do interior do Ceará, com o objetivo de sair da miséria e dar conforto a família. De prostituta, passou a ser dona do Complexo do Alemão, após a fuga de Gael. Grávida, agora tem Gael como inimigo, enquanto tenta reconquistar o coração de Marco e sobreviver.
Nos auge dos meus 15 anos, não esperava mais ser adotado.
E também não queria.
Não queria uma nova família. Um dia, tive uma, que por causa de Josué, foi destruída.
Nenhuma outra a substituiria.
Faltava alguns meses para completar 18, quando isso acontecesse, pelo estado poderia sair daquele inferno.
Mas infelizmente, sai antes disso.
Simplesmente aconteceu em um dia qualquer para mim, ela chegou acompanhada de uma funcionária.
Era bem mais velha do que eu, mais tarde descobri que tinha 35 anos, era solteira e não tinha filhos. Mas tinha todos os requisitos para adotar uma criança ou adolescente.
- Você vai pra casa comigo - diz com um leve sorriso nos lábios pintados de vermelho.
Algumas vezes ouvira Josué dizendo para minha mãe de forma ofensiva, que mulheres decentes não usavam batom vermelho.
Olhando para a mulher na minha frente, não sabia se isso se aplicava ou não.
- Não quero sair daqui - digo desviando o olhar.
- Por quê não? Aqui está longe de ser um lar.
- Se quer saber, já tenho um lar - digo mantendo meu tom de voz sério - Minha mãe vai vir me buscar - E se não fosse, iria atrás dela. Ela era minha casa.
- E onde está sua mãe?
Encaro o vazio, tentando imaginar minha mãe em uma cela com outras presas. Muitas vezes queria saber se estava pensando em mim, no Júlio. Se sentia nossa falta.
Eu sentia muita a falta dela. E tinha a impressão que ao passar dos anos, começava a esquecer do rosto dela. Não lembrava com clareza, só via um borrão quando fechava os olhos.
E não queria esquecer ela.
- Não é da sua conta - respondo ríspido.
Ela respira fundo, não se abalando com minha falta de educação, que já havia virado costumeira.
- Pode esperar por ela longe daqui - diz antes de me dar as costas e ir para a diretoria.
Contra minha vontade, uma semana depois tive que arrumar meus poucos pertences, que eram resumidos apenas em alguns Gibs, caderno de desenho e meia dúzia de roupas.
Legalmente havia sido adotado por uma completa desconhecida.
Fora do orfanato, me dei conta de que tudo que antes conhecia, havia mudado. Não era mais como antes.
Não fomos para a Rocinha.
As ruas eram parecidas com a Rocinha, mas não era.
A casa que ela morava, sem dúvida, era melhor do que a que morei com a minha família. Era espaçosa e arejada.
- Vai dormir aqui - diz ela, andando por um corredor, indicando a segunda porta a esquerda.
O quarto era simples, com apenas o básico, entretanto com duas camas de solteiro.
- Depois vamos comprar roupas pra você - Ela finaliza, saindo andando.
Continuo no mesmo lugar, encarando o cômodo a minha frente, me sentindo incapaz de me mexer.
Forçando minhas pernas, consigo entrar, olhando com atenção cada detalhe.
Ali não era minha casa e nunca seria.
Poderia parecer melhor de tudo que já tive um dia. Mas na verdade, nunca me importei com isso, só queria estar novamente ao lado de minha mãe e encontrar o Júlio.
Praticamente sem avisar, ela volta, agora acompanhada de outro garoto aparentemente da minha idade.
- Venha cá - diz ela, estendendo o braço na minha direção. Hesitante, me aproximo, parando a poucos passos deles - Este é o Rubens, ele é como você. Não tem família, ou alguém que se importe com ele - Desvio meu olhar para o garoto, o olhando de cima a baixo - Espero que vocês se dê bem, pois quando eu não estiver por perto, só teram um ao outro.
Dito isto, ela se afasta, sumindo ao sair do corredor. Volto a olhar para Rubens, sustentando seu olhar.
- Não me chama de Rubens não, este nome é feio pra caraio. Me chama de Rubinho - Continuo olhando para ele - Você não tem uma família mesmo? - pergunta por fim.
- Tenho minha mãe e meu irmão.
- E onde eles estão agora? - questiona erguendo o queixo.
Dou de ombros.
- Não sei.
- Então tu não tem - Ele passa por mim, parando no meio do quarto - Se tivesse uma família mesmo, não estaria aqui.
Engulo em seco, baixando o olhar.
- Quem é essa mulher?
Ele senta nos pés de uma das camas.
- E importa? O quê importa, é que temos do bom e do melhor aqui. Muito melhor do que o abrigo.
Inicialmente, não sabia se ali era melhor ou pior do que o abrigo, mas por alguma razão. Não conseguia relaxar.
A nova responsável por mim, preparou um almoço muito bom, diferente da comida que já estava acostumado no orfanato. Conseguia até lembrar da comida da minha mãe.
Ela nos observou comer. Com um leve sorriso na boca pintada de batom vermelho.
Rubinho não pareceu se incomodar, diferente de mim, que apesar de estar com fome, não consegui comer direito.
Depois de levar meu prato para a pia, no final do almoço, algo que Rubinho não fez, encontro ele esparramado no sofá da sala, assistindo um filme que passava.
Não era sempre que eu assistia televisão no orfanato, na maioria das vezes que queria, a televisão sempre estava ocupada em novelas, vistas pelas funcionárias que não perdiam um capítulo.
Os filmes e desenhos animados, eram algo raro de se ver, mesmo para as crianças menores.
Perdi completamente a noção do tempo, entretido, notava quando ela transitava de um lado para o outro, arrumando alguma coisa ou limpando o chão, mas nunca se mostrando incomodada por não estarmos ajudando ela.
Acredito que foi a partir deste momento, quando vi que ela não me era uma ameaça, que comecei a definitivamente relaxar.
Não demorou para que eu voltasse a frequentar a escola. Para mim, só restava aquele ano letivo, o quê para mim era um alívio, já que nunca gostei muito de estudar e odiava quando os professores ficavam pegando no meu pé, para fazer as atividades.
Rubinho não era da minha sala, o quê não foi algo ruim. Mesmo morando na mesma casa, não tinha uma certa afinidade com ele. Conversávamos pouco e na maioria das vezes me via arrumando a bagunça dele, para que não ouvíssemos reclamação da parte dela, mesmo sabendo que ela não reclamaria.
Para ele não existia limites, ultrapassava todos. Onde comida, largava o prato, as roupas sujas, deixava espalhadas no quarto ou banheiro. E na escola, vivia nos corredores, mas nunca dentro da sala de aula.
Nas poucas vezes, o diretor a chamava, dava um sermão nele e quando era no dia seguinte, lá estava ele, fazendo tudo novamente.
Apesar de eu não querer estar na escola, eu ia, ela havia me matriculado de noite por pedido meu. Também por eu achar que não tinha muitas pessoas e realmente não tinha, a maioria eram pessoas de idade avançada, tinha poucos jovens da minha idade.
No intervalo, ficava em um canto, observando a pouca movimentação.
Mas tudo mudou completamente, quando comecei a notar uma menina em questão.
Ela era negra, não muito magra. Tinha as pernas grossas e a cintura fina. O cabelo era cacheado, volumoso e sempre estava com algum livro na mão ou caderno, escrevendo alguma coisa.
Era a única também a fazer isso.
Ela era mais nova do que eu, teoricamente não era para estar estudando de noite, mas por alguma razão que eu não sabia, ela estava.
E isto me deixou curioso. Mas ainda com o fato, de assim como eu, não ter amizades.
Nunca via outra garota perto dela. Ou até mesmo outros meninos.
Pelo menos duas vezes, vi quatro meninos caçoando do cabelo dela, que até então achava bonito; Era natural, diferente dos cabelos das outras meninas, que passavam a maior parte do tempo dentro do banheiro, os mantendo a todo custo lisos.
Ela não parecia se importar.
Coloquei na minha cabeça que iria descobrir seu nome e descobrir, após a seguir até a sala onde estudava e ficar ouvindo a chamada da professora de inglês atrás da porta entre aberta.
Gabriela.
Naquela mesma noite durante a aula de informática, pesquisei seu nome, já que o mesmo não saía da minha cabeça.
Gabriela: Significa "mulher de Deus", "mulher forte de Deus" ou "fortaleza de Deus".
Depois disso, comecei a vê-la como uma fortaleza. Mesmo sendo caçoada por outros meninos e até mesmo por algumas meninas, por não vestir bem e usar roupas surradas, ela não se abalava, continuava entretida com os livros. E isto de alguma forma, me ajudou a continuar indo todos os dias para a escola, não perdendo um dia de aula, mesmo em dias chuvosos.
Passei a me interessar pelas aulas e principalmente ao tentar ser notado por ela.
Mas nada parecia chamar a atenção dela.
Tinha dias que via o cansaço estampado no rosto dela. Outros dias, não dava atenção para os livros, se debruçava sobre a mesa no refeitório e ali dormia.
E foi em um dias desses, que o cansaço a venceu, que Rubinho mais dois muleques, colocaram chiclete no cabelo dela.
Eles riam tão alto, que acordou ela e quando isto aconteceu, continuaram. Sem entender nada, ela ficava passando a mão pelo rosto e olhando para a própria roupa com a expressão confusa, até que ao passar a mão pelo cabelo, nota um emaranhado grudento.
O quê senti em seguida, foi o gosto de sangue na boca e quando me dei por mim, estava em cima de Rubinho, distribuindo murros e ponta pés no corpo dele.
Os amigos dele até então, só ficaram olhando a cena, observando o amigo apanhar, enquanto mais alunos se aproximavam.
Bati nele até cansar, até perder o fôlego e me dar conta que ele não se mexia no chão, que apenas gemia de dor.
A inspetora se aproxima rapidamente, me empurrando para trás, gritando por outra.
Rubinho é levado as pressas e eu, levado para a diretoria.
Minha responsável não demora para chegar, quando chega, ouve com atenção tudo o quê o diretor tem para dizer e sem me dizer uma palavra para mim, se despede, me levando junto com ela.
Rubinho passou o restante da noite em observação no hospital, só recebendo alta no dia seguinte.
Quando ele chegou em casa, ela nos reuniu na sala e na nossa frente, fez a pergunta óbvia.
- O quê aconteceu?
Rubinho me olha, com o olho esquerdo roxo e o lábio inferior partido.
- Ele grudou chiclete no cabelo da Gabriela quando ela tava dormindo - digo sem hesitar.
Ela o olha, sem demonstrar emoção.
- Você fez isto?
Ele dá de ombros.
- Fiz. Talvez agora ela arrume aquela vassoura.
- Não iria gostar que fosse com você, Rubens.
- Isto nunca aconteceria comigo.
- Será mesmo? - Ela cruza os braços.
- Eu não sei nem por quê ele me bateu - diz ele elevando a voz - A menina é mó feia. Tem um cabelo ruim. Usa roupas dos outros. Parece um bicho! Fiz foi um favor pra ela - Ela escuta tudo em silêncio, semicerrando as pálpebras - Se ela vacilar de novo. Faço de novo.
- Gael - diz de repente, atraindo minha atenção - Não faça isto de novo. Não bata mais em Rubens - Franzo o cenho, pego de surpresa - Ele é sua família agora.
- Ele colocou chiclete no cabelo dela! - Ressalto, acreditando que ela não havia entendido aquela parte.
- E?
Rubinho olha para mim.
- Isto foi errado - digo baixo - Minha mãe sempre nos disse que não era pra caçoar de ninguém, principalmente dos que não tinha muita coisa assim como a gente.
- Sua mãe não está aqui. Quem está aqui sou eu e se digo que não é mais pra bater nele, tem que fazer o quê digo - Ela se inclina em minha direção, os olhos fixos nos meus - Está entendendo? - Pressiono meus lábios com força, impedindo que qualquer palavra saísse da minha boca. Ela segura com força meu queixo - Entendeu?!
- Entendi - digo entre dentes.
- Aquela menina não é nada sua. Não é sua família. Nada! E quero que ponha na sua cabeça, que nenhuma mulher presta, nenhuma vai se aproximar de você para não querer nada em troca ou para não fazê-lo sofrer. Se entender isto o quanto mais cedo, melhor será pra você. Rubinho já entendeu, agora só falta você.
Ela se afasta, nos deixando sozinho. Rubinho me olha por alguns segundos, antes de fazer o mesmo, seguindo pela direção contrária.
Mesmo com as palavras dela ecoando em minha mente, era uma completa contradição a tudo que minha mãe já havia nos ensinado.
Tudo parecia ter voltado ao normal depois daquele dia, pelo menos para mim.
Rubinho continuava colocando o terror na escola, sendo levado para a diretoria e ela chamada.
Eu por outro lado, continuava observando Gabriela e odiando todos que se aproximava dela apenas para caçoar dela.
Ela não merecia passar por aquilo, só por quê não tinha roupas boas ou um cabelo igual das outras meninas.
Vi a esperança de me aproximar dela, antes dos término das aulas, quando Rubinho entra na sala que eu estudava e se senta ao meu lado.
- Tenho um recado para você - Ignoro ele, continuando a fazer a atividade da aula anterior - É daquela menina lá. A do cabelo duro - Olho para ele, o fuzilando com o olhar, conseguindo dessa forma que um sorriso cínico surgisse em seu rosto - Calma aê. Só vim dar o recado. Ela disse que quer encontrar você depois da aula, naquele beco perto daqui - Se inclinando na minha direção, aproxima a boca do meu ouvido - Disse que é pra chegar daquele jeito. Você sabe do que tô falando. Já fiquei com ela e ela gosta disso. De ser pega a força.
Por algum motivo, não duvidei dele. Talvez finalmente ela havia me notado e até poderíamos começar a namorar.
Isto me encheu de esperança e não hesitei em esperá-la sair da escola, começando a segui-la pela rua mal iluminada.
Sabia qual era o beco que ela havia mencionado. Só precisava agir na hora certa e surpreendê-la.
E assim foi feito.
Eu a surpreendi e quando ela quis gritar, tampei sua boca com a minha mão, enquanto com a minha outra mão, suando frio devido ao nervosismo, a passo por todo seu corpo, sentindo sua pele macia e inalando seu perfume de flores.
Era o mesmo perfume que minha mãe usava.
Cheiro profundamente seu perfume, mordiscando o local, não querendo mais adiar o quê nós dois queríamos.
Ao tentar entrar nela, sinto uma resistência estranha, mas que ao forçar mais um pouco, consigo passá-la, precisando me conter meu gozo, no instante em que me sinto dentro dela, rodeado por um calor e umidade perfeito.
Inicialmente não sei o quê fazer, apenas improviso, não prestando atenção em qualquer barulho ao nosso redor, apenas no que estava fazendo.
É só quando termino, quando gozo dentro dela, sentindo uma espécie de eletricidade percorrer meu corpo, que noto que ela estava chorando.
Sim, Gabriela chorava e implorava para que parasse.
Isto me fez me afastar rapidamente dela, completamente confuso e atordoado por causa do gozo intenso.
Ela não havia gostado, penso, me dando conta que não havia dado atenção a ela, que só havia me concentrado no meu prazer.
Com medo de ouvir tais palavras da boca dela, saio correndo do beco, sem uma direção certa, até que sem para onde ir, vou para o único lugar que podia chamar de casa.
Rubinho não havia chegado, como sempre, o quê me deu tempo de tomar um banho e me deitar, fingir que estava dormindo.
Quando ele chegou, não ousou me chamar, apenas se jogou em sua cama e em alguns minutos, seu ronco tomava o quarto.
A cena de Gabriela chorando, não saia da minha cabeça. Me perturbou nos dias seguintes.
Não consegui voltar para a casa. Temia que ela tivesse contato a alguém o quê havia acontecido e todos, e Rubinho, começassem a me caçoar.
- Você pegou a feinha de jeito, hein - diz Rubinho uma noite, após voltar da escola, me encontrando deitado em minha cama lendo um Gibi - O comentário que tá lá na escola é que ela tá grávida.
Desvio o olhar no mesmo momento da revistinha em minhas mãos, o olhando, não querendo esboçar nenhuma surpresa.
- E quem disse que peguei ela?
Ele ergue as sobrancelhas.
- Tu amarelou?
Dou de ombros.
- Você mesmo disse que ela era feia. Por quê iria pegar ela?
- Sei lá, pra passar o tempo. Tirar o atraso. Mulher só serve pra isso mesmo, principalmente as feias como ela - diz sentado na beirada da cama dele, tirando o tênis - Basta saber quem foi o sortudo que agora vai ser pai. O cara foi tão burro, que nem usou camisinha - Em seguida ele sai do quarto.
Eu não havia usado camisinha. Até aquele momento, não sabia que precisava usar uma.
Em nenhum momento da minha vida, ninguém havia me ensinado sobre isto. A única coisa que sabia, era que os bebês vinham das mulheres, mas não sabia como exatamente que eles eram formados e isto nunca me interessou.
Não era de mim mesmo que uma criança iria sair de mim.
Mas era de Gabriela que sairia um filho meu.
E isto me apavorou.
Não tinha como eu criar uma criança. Não tinha casa ou emprego.
A missão que impus a mim mesmo nos dias que se seguiram, foi descobrir onde Gabriela morava. Deu um pouco de trabalho, mas descobri.
Ela morava com os avós e mais duas irmãs.
Durante o dia, trabalhavam na rua, principalmente nos sinais, vendendo bala.
Isto explicava o cansaço de Gabriela.
Não demorou para a barriga se tornar aparente. Mesmo assim, ela não parou de trabalhar e estudar. Por onde passava, os comentários surgiam, principalmente pelo fato de não saberem quem era o pai da criança.
Eu queria dizer que era eu. Queria dizer a Gabriela que sentia muito e que não queria ter engravidado ela, mas tinha medo. Tinha medo de ser rejeitado e principalmente dela com isto, tirar aquele bebê de dentro dela.
Querendo ajudar de alguma forma, comecei a trabalhar. Por não ter experiência, comecei com os bicos simples. Fazia favores, era ajudante em obras e até me arriscava em vender balas nas ruas.
Quando juntei um bom dinheiro e descobri por uma vizinha de Gabriela que seria pai de uma menina, pedi para uma conhecida comprar todo o enxoval, de preferência da cor rosa e levar até a casa dela.
De longe, vi um largo sorriso estampar o rosto dela, quando ela chegou lá com as roupas, assim como o de sua avô.
Me senti em paz. Mas não suficiente. Aquilo não era o bastante.
E os bicos que fazia, também não era.
Um dia, entrando em casa, vejo Rubinho saindo do quarto dela, apenas com uma toalha enrolada na cintura, completamente suado.
No mesmo momento, entendi o quê estava acontecendo e tentei ir para o quarto que dividíamos.
- Gael - Ela me chama de dentro do quarto dela.
Hesitante, sob o olhar de Rubinho, me aproximo da porta aberta, mantendo meu olhar baixo, quando a noto nua deitada sobre a cama, acariciando seu sexo entre as pernas.
- Chamou?
- Vou ensinar a você como conseguir prazer de uma mulher.
Eu não queria. Não pelo o quê havia acontecido com Gabriela, mas por não gostar dela, por só ver ela como alguém que havia me tirado do abrigo e por me dar tudo que precisava, na medida do possível.
Era de Gabriela que ainda gostava, mesmo sabendo que ela não queria me ver.
- Tá esperando o quê? Vai logo! - diz Rubinho, me empurrando pra dentro do quarto, fechando a porta atrás de mim.
- Vem cá - diz ela novamente - Não sabe por quanto tempo esperei por isto.
Ela me fez transar com ela, de todas as formas e posições possíveis.
Foi diferente com ela. Ela não chorou como Gabriela ou pediu para parar, pelo contrário, me pedia mais e mais. E o desejo acabou sendo mais forte e me entreguei completamente a ela.
Me esqueci completamente de Gabriela e a bebê pelas semanas seguintes. Já não trabalhava, já que preferia passar o dia, a dividindo com Rubinho.
Minha vida parecia perfeita. Afinal, tinha tudo o quê queria, sem sair de casa.
Até que deixou de ser perfeita e um grande vazio me tomou.
Não queria ter que depender dela o resto da minha vida. Ainda tinha uma vingança para executar e o passado fazia de tudo para se tornar presente todos os dias.
E também havia Renata. Sim, este foi o nome que ela escolheu, soube disso, quando a vi voltando do posto de saúde com a menina enrolada em uma manta fina e perguntei para uma senhora que ela cumprimentou.
O nome da minha filha era Renata e só consegui olhá-la de perto, um ano depois, quando entretida conversando com umas senhoras, a vó de Gabriela se distraiu e pude me aproximar da minha filha.
Havia traços meus nela e isto me deixou radiante mas, principalmente me fez querer ser alguém que tivesse muito dinheiro para vê-la sorrir quando pudesse lhe dar o quê quisesse.
Foi aí que lembrei que Rubinho ultimamente, vivia mais tempo fora de casa, segundo ele "trabalhando" e quis saber com o quê.
- É uma parada perigosa, mas dá dinheiro - diz ele uma noite, com um baseado entre os dedos, encarando o céu estrelando.
- E o quê é?
- Droga - Ele me olha - Só entra quem tiver coragem.
Coragem eu tinha de sobra. E Renata havia virado minha motivação.
- Tô dentro.
Ele sorri sarcástico.
- Tem certeza, neguinho? Depois que entrar, não tem volta não. Tu pode ser preso ou pior, morto.
- Ligo não.
Colocando o cigarro entre os lábios, estende a mão para mim, que aperto.
Só não estava esperando, que no ano seguinte, com meus dezessete anos, seria preso quatro vezes, mandado para a Fundação Casa e cometeria meu primeiro homicídio.
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