"Meia verdade, pode ser uma mentira?" Bebês gêmeos Meias verdades Intrigas Comédia romântica Investigação Geovana trabalha desde os dezoito anos em um escritório, e depois de cinco anos de trabalho árduo e pontualidade, acreditou que seria promovida, porém isto não acontece. Na verdade ela perde seu emprego e como se o dia não pudesse piorar, ela descobre que seu namorado a está traindo. Totalmente arrasada, ela desabafa com a amiga e revela que deseja abrir mão de um convite para um cruzeiro que havia ganhado dias antes e que a jovem pretendia curtir com seu namorado. Porém, incentivada pela amiga, ela embarca nesta aventura em alto mar, sozinha. Adrian é CEO de uma das maiores empresas de turismo, porém há suspeitas de fraude e desvio de verba nos cruzeiros realizados pela empresa. Para averiguar da perto o que pode estar acontecendo, ele embarca clandestinamente em seu próprio cruzeiro. Entre muita investigação e confusão, a semana no cruzeiro será a mais interessante na vida do casal. Mas, e depois que o cruzeiro acabar, como seguirá esse romance?
Geovana
Minhas mãos suam, os joelhos tremem, o suor desce como bica pelo meio de minhas costas, meus olhos estão arregalados e a tensão não permite que o ar passe corretamente por meus pulmões.
Nataly e eu estávamos em frente a TV, aguardando o resultado do sorteio. É praticamente impossível ganhar, literalmente uma chance em um milhão. A maior revista de turismo do país ofereceu um número em cada unidade vendida de sua revista. A belezinha nunca vendeu tanto. Sempre que eu ia até a banca de jornal a revista já havia esgotado, isso mesmo, nada de unidade baixada ou comprada pela internet, só valia revista física.
Quantas pessoas compraram várias unidades? Pois é, eu comprei só uma. A revista não é baratinha, não, e eu sou recepcionista de um escritório de advocacia, ou seja, ganho pouco.
Pra completar, o bilhete te dá direito a tudo pago pra você e seu acompanhante durante todo o cruzeiro. É muita sorte ou não é?
Minhas mãos começam a pingar suor de nervoso.
- Cacete, esse sorteio que não começa - Nataly está tão aflita quanto eu. Nossa diferença é que sempre sofri calada, suo frio, me dá tremedeira, dor de barriga... mas não fico falando. E ela é meu completo oposto.
- Ai, tá dando dor de barriga - reclamo pela primeira vez.
- Segura aí, mulher. - Cruzo as pernas pra tentar fazer a cólica, que tomou meu intestino, passar, mas de nada adianta.
- Não vou aguentar, Naty.
- Segura esse orifício, mulher, já deve entrar a qualquer momento.
A sala escura só está sendo iluminada pela luz azulada da TV. O sofá branco e aconchegante da casa da Naty acomoda muito bem nós duas, mas eu rebolo sentada no lugar, como se algo me incomodasse, e me incomoda mesmo: a dor na barriga.
- Não vai dar, Naty, está ficando insuportável. - Me levanto na mesma hora e jogo a minha revista no colo dela, a coitada totalmente amarrotada de tanto que eu espremo-a de um lado a outro. - Se falar meu número, me avisa.
Só tenho tempo de correr para o banheiro e me sentar na privada. Sinto o alívio na minha barriga no mesmo momento que escuto o grito da Naty vindo da sala não muito distante.
- É isso, cacete, sorte do caralho! - escuto-a gritar e festejar na sala e eu tenho vontade de levantar para agarra-la e parabeniza-la, mas a barriga não está permitindo que eu me levante ainda. Tenho certeza que a sortuda foi ela.
Quando tento me levantar do sanitário, Naty invade o cômodo pequeno e se arrepende no mesmo segundo, retornando para fora e gritando do outro lado da porta.
- Sua cagona, nos dois sentidos, não acredito que você comprou só uma revista e foi seu número que saiu!
- O quê? - grito totalmente incrédula - Tá de sacanagem com a minha cara, né.
- É claro que não, acha que ia brincar com isso? Aliás, você tem que ligar em meia hora ou vão realizar outro sorteio. E se fizerem outro o seu está cancelado.
Arregalo os olhos, não posso perder a chance única da minha vida.
Me levanto, me arrumo rapidamente e deixo o banheiro da minha amiga.
- Apertou o botãozinho do aromatizante, amor? - debocha ela. O nervoso era tanto que estava me esquecendo, então voltei e acionei o botãozinho.
Corri para a minha bolsa e peguei o meu telefone, fico ainda mais nervosa porque a porcaria do número só dá ocupado. Não credito que vou perder meu bilhete por causa de um telefone ocupado? Ligo insistentemente até que cinco minutos depois sou atendida. Parece rápido, mas esses cinco minutos pareciam cinco horas.
A atendente justifica que a linha ficou congestionada de pessoas contestando o resultado e por isso a demora para ser atendida. Passo todos os meus dados e os dados do meu acompanhante: Willian Gomes.
Agora a ansiedade me toma, preciso falar com Willian, preciso contar a ele que teremos nossa Lua de Mel antecipada. Namoramos há três anos e esse é nosso presente de casamento antecipado. A nossa merecida lua de mel que não teríamos como pagar.
- Muito sortuda, cara. Uma revista só! Tu merecia muito, viu. Deus olhou de lá de cima e viu alguma coisa em você, minha amiga.
- Se eu não tivesse o Will, te levaria. Você sabe, né?
Abraço-a na porta de sua casa, já me despedindo dela.
- Eu sei, mas não se preocupe com isso, não. Sorte é sorte, e ela é sua. Você mereceu. Vai contar pro seu amado.
Com um sorriso me despeço de Nataly e pego meu telefone, ligando para o meu namorado. Ele demora a atender, mas na segunda tentativa, me atende no primeiro toque.
- Fala gostosa, tava ocupado.
- Vem me encontrar no nosso barzinho de sempre.
- Agora? Tô ocupado, gata.
- O que você está fazendo de tão importante em um domingo a noite?
- Eu sou autônomo, né, gostosa. Tenho que adiantar as coisas pra amanhã.
Suspiro fundo, mas eu não ia ceder.
- Ganhei o sorteio.
- Que sorteio?
- Aquele da revista de turismo que dava um bilhete com direito a acompanhante com tudo pago no cruzeiro mais chique do Brasil.
- Tá de sacanagem?
- Não tô, pergunta pra Naty. E se você não vier me encontrar, vou levar a Naty no seu lugar.
- Ah, não, pô. Eu sou seu gato, vai levar amiga pra cruzeiro nada.
- Então vem pro nosso barzinho, e eu não posso esperar muito, não. - Exijo e desligo no segundo seguinte.
Caminho para o barzinho combinado, me acomodo e peço uma cerveja. Em menos de dez minutos Will chega.
Seu perfume me embriaga, os cabelos encaracolados úmidos de um banho recente o deixa ainda mais bonito. A camisa azul clara semiaberta, mostrando o peito moreno sem pelo algum.
- Oi, meu amor - fala ele e se inclina para me beijar antes de se sentar. - Fala que foi só uma piada pra me tirar de casa, não vou ficar chateado.
- Não é piada. - Jogo a revista na frente dele - Confere o número sorteado no site da revista.
- É sério então?
- Super sério.
- Caraca! - Ele abre na parte que explica sobre o sorteio e vê as fotos do cruzeiro - Buenos Aires?
- E Montevidéu - Bebo minha cerveja.
- Nove dias?
- E oito noites.
Ele continua lendo as informações.
- Tudo pago, tipo, tudo mesmo?
- Tudo - pego a revista de sua mão. - Embarque e desembarque em Santos.
- Em São paulo? Mas como nós vamos pra lá? Tenho dinheiro, não, gata.
- Nem eu, gato. Vai pedir sua cerveja, não?
Ele ergue a mão, pedindo uma garrafa ao garçom.
- Então como vamos?
- Um carro de aplicativo vai vir nos buscar e nos trazer, tudo pago, lembra?
Seu sorriso se amplia.
- Caraca, aí, sortuda mesmo.
- Nunca tive sorte na vida, Will, acho que alguém lá em cima teve pena de mim e resolveu me dar uma trégua.
- Nunca imaginei tirar férias em um lugar como esse?
- Nem eu, Will, nunca nem tirei férias! Desde que comecei a trabalhar no escritório do Doutor Carlos. Sempre aceitei trocar as férias.
- Mais que merecido, então.
Ele pega sua cerveja e vira direto da garrafa na boca. Bebe direto do gargalo como ele sempre faz.
- Sem contar que é nossa Lua de mel antecipada, né.
Ele para de engolir a cerveja e me encara, engole e finalmente fala.
- Lua de Mel?
- Três anos de namoro, Will, tá na hora de casar, né.
Ele volta a beber, dessa vez um grande gole.
- Claro, gata, tá na hora, mesmo.
Adrian
Meus cotovelos estão sobre a mesa, a cabeça pende sendo firmada por minhas mãos. Esfrego meus cabelos crespos e curtos com os dedos em sinal de nervosismo.
- O que diabos está acontecendo nessa empresa?
Resmungo comigo mesmo.
Recosto-me na cadeira, encarando os papéis a minha frente. A pilha que se forma ao lado de contas que não batem, faturas com supervalores.
- Quem fez isso? - questiono para mim mesmo, mas o ar frio do ar condicionado altíssimo da minha sala não irá me responder. Pego o telefone para falar com a secretária.
- Antonela, marque uma reunião com toda a liderança, por favor. Pra hoje em uma hora.
Dou a ordem e me recosto novamente, ainda encarando os papéis. Fiz e refiz as contas várias vezes e nada de chegar a uma conclusão diferente de que há um rombo na empresa. Um rombo de milhões em poucos meses. Se continuar assim, a empresa vai precisar pedir falência porque não teremos condições nem de abrir as portas.
Retiro meus óculos de grau e coloco sobre a mesa, pendo a cabeça para trás com as mãos no rosto e então ouço alguém bater na porta.
- Entra - ordeno ao me recompor, mas é minha mãe. A mulher que ergueu esta empresa ao lado do meu pai.
- Fui avisada da reunião, ainda aquele problema do rombo?
Ela se senta na cadeira acolchoada na minha frente e cruza as pernas, seu olhar preocupado me alerta que as coisas estão piores do que ela deixa transparecer.
- Pior - revelo.
- Pior? Como pode ser pior?
- Outro rombo, dessa vez ainda maior. Já contabiliza um milhão e meio em menos de um mês, e não tem indícios de quem fez isso.
- Já tentou ver quem está emitindo as notas? - ela me questiona, mas foi a primeira coisa que fiz, é claro. Peguei as cópias e joguei para que ela as visse.
- Ao que parece a senhora ou eu fizemos todas as aquisições superfaturadas, e não há nem indícios do produto e nem da empresa que vendeu os produtos. - Peguei outro bolo de notas - Estas são as notas das bebibas compradas para os cruzeiros, as bebidas existem, cada garrafa está confirmada, porém o valor...
Minha mãe arregala os olhos escuros por trás de seus óculos de grau, todos na minha família usam óculos, deve ser genético.
- Meu Deus, uma garrafa de vinho, que nem é dos considerados caros, 200 mil reias?
- Um vinho que custa em torno de 32 mil, o que já é considerado caro pra grande maioria. E se a senhora olhar um por um, vai ver que existem superfaturamentos em coisas menores... discorri para minha mãe todos os rombos que encontrei e isso tomou nossa hora restante.
Levantamos e fomos até a sala de reuniões, ali eu sabia que teria que repetir e demonstrar aos presentes tudo o que já havia demonstrado a minha mãe.
A mulher se senta na cadeira a minha direita e quando meu irmão, Jairo, chega, ele se senta a minha esquerda. Meu pai faleceu há alguns anos e a empresa ficou sob a minha responsabilidade desde então.
Chegam os demais diretores e suas assistentes e então temos início a nossa chata e longa reunião.
Demonstrar a todos eles aquele rombo não foi nada confortável, até porque existia um ponto desconfortável nisso tudo. Todas as notas estavam emitidas em meu nome, como se eu tivesse feito as compras. Meu irmão e minha mãe sabiam que isso era um golpe, o verdadeiro culpado estava escondido sob alguma gravata por aí e eu estava sendo colocado como escudo, escondendo-o, mas foi possível ver o olhar de desconfiança em alguns diretores.
A facada que senti entrar em meu peito doeu na minha alma, ao ver a desconfiança no olhar deles. Mas então eu tive uma ideia. Ao terminar a reunião, dispensei a todos, menos minha mãe e meu irmão.
- Vocês viram o que eu vi, não é? - questionei só pra ter certeza de que eu não tinha alucinado.
- Aqueles imbecis só estão preocupados com o próprio bolso, meu irmão. Culpar você é mais fácil do que encontrar o verdadeiro culpado - Jairo me apoia, eu sei que se trata exatamente disso.
- Você teve alguma ideia, não é? Não nos pediria pra ficar se não tivesse tido alguma. - Dona Solange me conhece muito bem.
- É, eu tive. Nosso maior rombo até agora foi em um dos nossos cruzeiros, temos um para acontecer agora em menos de uma semana. Vou embarcar nele sem aviso prévio. Vou em todos os estabelecimentos, funcionário por funcionário, batendo todas as informações, algo me diz que vou encontrar alguma coisa lá.
Minha mãe balança a cabeça concordando.
- Tem certeza que pode encontrar alguma coisa lá? - meu irmão pergunta, parece meio incomodado só não sei o motivo.
- Eu já procurei aqui e não achei nada.
- Já cercou os caras do setor financeiro da empresa?
- Pra todos os efeitos eu fiz a compra, ou minha mãe. Eles nunca questionariam algo assinado por um de nós dois, seja lá quem for que fez isso, pensou em tudo.
- Então os caras do setor financeiro não sabem de nada?
- Se sabem, ninguém disse. E provavelmente não dirão.
Jairo bufou.
- Sabe o que estou vendo, irmão? O esforço de anos do papai e da mamãe indo pro ralo. - comenta ele desanimado.
- Por que acha que eu vou embarcar naquele cruzeiro sem avisar a ninguém? Se isso continuar assim, em pouco tempo teremos que fechar as portas, uma das maiores empresas do país fechando as portas por causa de desvio de verba bem de baixo do nariz, e ainda vão me culpar por isso.
Tanto minha mãe quanto meu irmão exalam um ar pesado dos pulmões, carregado de puro desânimo. Sou o primeiro a deixar a sala de reuniões, em silêncio, e sou seguido pelos outros. Sem uma despedida, cada um segue para sua devida sala, cumprir seus afazeres e eu vou tentar me distrair com os meus, tentar desviar a atenção disso.
Cumprimento Antonela ao passar por ela e vou na direção de minha sala, mas antes que eu abra a porta ela vem correndo na minha direção, seus saltos rangendo sobre o piso liso, os cabelos curtos e cacheados balançando com urgência de chegar até mim antes que eu abra a porta, isso não é um bom sinal.
- Senhor Brandão. A senhora Mirela disse que tinha que falar com o senhor e entrou na sua sala sem autorização, eu disse que ela não podia entrar, senhor, mas ela não me ouviu e saiu entrando. Não pude fazer nada.
Respiro fundo, como se toda desgraça fosse pouca, ainda tem isso.
- Não se preocupe, Antonela, eu atendo a senhora Mirela. Da próxima vez eu tranco a porta.
Ela sorri aliviada e se afasta. Já houve o tempo que eu precisava fazer isso, trancar a porta para que Mirela não invadisse minha sala. Entro no cômodo gelado e dou de cara com ela sentada na minha cadeira, pernas cruzadas, usando um terninho rosa claro e uma nova cachorrinha em seu colo. Essa eu ainda não tinha visto.
- Quais ventos tenebrosos de inverno a trazem aqui, Mirela? - questiono-a tentando afastar a irritação e colocando um ar divertido na face, algo que eu sei que a irrita.
- Por que fala assim comigo, meu bombom? - Ela se levanta, coloca a cachorrinha no chão e vem na minha direção.
- Não sou seu bombom já tem tempo.
- Três meses. - Estalou a língua - Provou da carne branca e não gostou?
- Já tá falando besteira. - Me direciono para a minha cadeira e ainda bem que me sento antes de ouvir o que a motivou a vir ao meu escritório.
- Vim para marcarmos nosso casamento, baby, estou grávida.
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